“Eu sou mulher, preta e periférica. Cresci na Casa Verde Alta, bairro da zona norte de São Paulo. Meu pai sempre foi autônomo – e isso me inspirou bastante a ter meu próprio negócio – e também meu irmão, que aos 35 anos começou a empreender na área de TI. Sempre ouvia meu pai e meus irmãos dizendo que jamais iriam ser funcionários de alguém. Só que, diferentemente deles, fui ser atleta.
Por muitos anos fui da seleção brasileira de atletismo e desde os meus seis anos gosto de esportes. Comecei com o balé, depois fui para capoeira e com 15 anos já pensava em fazer faculdade nessa área. Meu mestre de capoeira pediu que eu estudasse educação física para poder ser professora, ter licenciatura e dar aula em seu lugar.
Naquele tempo não tínhamos dinheiro para pagar faculdade, mas por meio de uma peneira para esportes de alto rendimento consegui uma bolsa e fui convidada a compor o time de atletismo. Lembro de me destacar muito rápido e isso me fez parar com a capoeira. Foi por meio do atletismo que comecei a ter independência financeira e me formei.
Quando estava finalizando o curso, uma grande marca esportiva me convidou para trabalhar em um projeto para combater o sedentarismo. Em 2003 vi minha carreira como professora na área ganhar força. Com o salário do projeto, minhas questões como atleta estavam todas resolvidas. A iniciativa deu tão certo que durou três anos e de professora passei a ser coordenadora. Quando acabou, foquei totalmente em me classificar para os jogos Pan-Americanos de 2007, no Rio de Janeiro.
No início de 2007, eu tinha a ideia de começar a empreender, mas não sabia como. Foi quando uma grande marca me convidou para integrar um projeto que ajudaria corredores de rua. Eu basicamente os orientava com exercício funcional e dicas para as pessoas que treinavam no Parque do Ibirapuera. Ao final da iniciativa, muitos alunos quiseram continuar as consultorias comigo. A partir daí, comecei a empreender, dando aulas de corrida e consultorias esportivas.
Em 2013, me formalizei como Microempreendedora Individual (MEI), pois assim poderia ter uma máquina de cartão para facilitar os pagamentos. No ano seguinte, decidi ser mãe, encerrei minha carreira nas pistas e foquei totalmente em ser personal trainer. Mas em 2017 minha categoria deixou de fazer parte do MEI; pensei, então, em abrir um estúdio na minha casa para dar aulas e conseguir cuidar dos meus filhos.
Meu marido – que na época era atleta – decidiu se aposentar após disputar as Olimpíadas de 2012 e 2016. Começamos a ver opções para iniciar nosso próprio negócio. Nessa época (2018), a onda do crossfit chegou forte ao Brasil. Após muitas pesquisas, no mesmo ano, descobrimos a Feira do Empreendedor do Sebrae-SP. Eu e meu marido participamos de diversos cursos no evento.
Decidimos montar um espaço com crossfit, pilates e dança. Passamos três meses estruturando nosso negócio. Um consultor do Sebrae nos instruiu a pedir um empréstimo no banco. Só que como o banco vai emprestar dinheiro para uma mulher preta e ainda por cima ex-atleta? Estávamos quase desistindo, quando descobrimos o Desenvolve SP, que foi fundamental. Nós nos enquadrávamos em todos os pré-requisitos e, como todo o processo era online, não haveria problema.
Após as análises, um consultor do banco agendou para conhecer o local, mas o locador decidiu não alugar mais para mim – os motivos, já sabe, não é? Sem espaço e faltando uma semana para a visita do banco, fiquei dia e noite procurando outro ponto. Por fim achamos, custando o dobro e faltando quatro dias para a visita do banco.
Após a visita, a consultoria do Desenvolve SP pediu para que toda documentação fosse alterada para o endereço; em 20 dias refizemos tudo e enviamos. Passados sete meses do reenvio da papelada, meu financiamento foi aprovado para a reforma do espaço, compra de equipamentos e capital de giro. Foi um caminho difícil, mas estamos colhendo aos poucos os frutos. O Studio Olimpic Shape era um sonho que se tornou realidade.
Tive muito medo de começar a empreender. Apesar de, na época, estar em uma situação muito tranquila, não consigo ficar parada. Amo o que faço, mas precisei sair da minha zona de conforto. Minha mensagem é para as mulheres pretas. Acredite nos seus sonhos, porque quando você acredita, tudo se transforma. Precisamos pensar em conjunto; devolva toda ajuda que você teve para as pessoas. Faça o certo e não passe por cima de ninguém. Acredite e construa.”
*Estagiário sob supervisão dos editores
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