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Sorvete para o ano inteiro

É possível fugir da sazonalidade do setor e vender bem mesmo nas épocas frias do ano, com investimento em novos sabores, produtos e apresentações
Por Rogério Lagos
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Mesmo em um país tropical como o Brasil, a chegada do inverno costuma ser um período de baixa nas vendas de sorvete. A queda da temperatura, especialmente nas regiões Sudeste e Sul do País, costuma jogar contra esse setor, que reúne mais de 10 mil empresas, sendo 92% delas micro e pequenas, de acordo com a Associação Brasileira das Indústrias e do Setor de Sorvetes (Abis). Contribui para isso também o mito de que “tomar gelado” pode causar gripes e resfriados – doenças que, na verdade, são provocadas por vírus.

Hoje, ainda segundo a Abis, o mercado de sorvetes fatura acima de R$ 13 bilhões por ano e gera cerca de 100 mil empregos diretos e 200 mil diretos. O consumo per capita em 2021 no Brasil foi de 4,73 litros de sorvete por habitante, número que já foi maior: em 2019, eram 5,19 litros por pessoa. “Houve uma diminuição na atividade econômica que gerou queda do poder aquisitivo das classes C e D, o que veio a ocasionar uma perda significativa. E logo depois tivemos o estrangulamento do setor por conta da pandemia, quando houve uma limitação no comércio e food service de maneira geral”, explica Eduardo Weisberg, presidente da Abis.

Para driblar a sazonalidade do sorvete, a Solaretto Sorvetes, em Itápolis, investe na criatividade. Fundada pelo chef sorveteiro Flávio Augusto em dezembro de 2009, a empresa recorre às habilidades publicitárias do dono para criar receitas que cativam os clientes em qualquer época do ano. “Percebi que era possível criar com sorvetes como criava na publicidade. Troco minha folha em branco por infinitas possibilidades de sabores e apresentações”, conta.

Augusto e seus pais, que fazem a gestão e tomam as decisões em conjunto, sabiam que o inverno seria desafiador. Com isso em mente, criaram já em 2010 uma campanha de novidades da estação, que envolve o lançamento de sabores específicos, novas taças, mudança no layout, ampliação, reforma da loja ou qualquer outra ação. A ideia é criar um fato no estabelecimento que atraia os clientes.

Atualmente, a Solaretto possui um cardápio bem extenso com mais de 200 tipos de taças de sorvetes, sobremesas diversas e uma linha de açaí. Outros momentos importantes para manter o interesse dos clientes em alta são os lançamentos nas datas comemorativas. Ovos de Páscoa recheados com sorvetes, os “sorvettones” no Natal e as taças temáticas não costumam faltar. “A sazonalidade só vai ser um desafio se você não olhar para ela como uma oportunidade. Com os lançamentos que fazemos, principalmente a partir de julho, o gráfico começa a ascender novamente”, ressalta o empreendedor.

Já o empresário Francisco Palhares, da Palhares Gelato, remodelou o seu negócio para tentar abrir o leque de consumidores: mesclou a sorveteria com cafeteria e tapiocaria. “Abri a sorveteria em pleno inverno e quase não aguentei o respiro do mercado. Decidi que não sofreria mais e fui buscar alternativas”, diz Palhares. Além de oferecer outros produtos que vendem o ano inteiro, o empreendedor elaborou um cardápio de inverno com sorvetes assados, bolos com sorvete, petit gâteu, entre outros itens.

A estratégia deu tão certo que o pequeno negócio, que começou em Ibitinga em março de 2016, ganhou uma nova unidade em Araraquara em 2019, com conversas avançadas em outros municípios para novas lojas no modelo de franquia. Atualmente, entre os meses de outubro e março, 80% do faturamento é oriundo dos sorvetes, enquanto que de abril a setembro a tapioca passa a ser o principal produto, chegando a alcançar 70% das vendas. “Em época de chuva ou frio vendemos poucos sorvetes, mas muita tapioca. Conseguimos manter a margem e não entramos no vermelho. Só que muitas pessoas que vão comer a tapioca, chegam na loja e encontram um ambiente climatizado, aconchegante, acabam tomando sorvete também. Conseguimos resolver o problema do inverno comercializando os produtos de forma conjunta”, afirma Palhares.

ALIMENTO

Para os empreendedores e a própria Abis, uma estratégia é fazer com que os clientes passem a enxergar o sorvete como um alimento, não como uma guloseima. Os empreendedores entendem que essa é uma construção que passa – e muito – pela qualidade e pelas opções do que é oferecido. Na Palhares Gelato, por exemplo, todos os sorvetes possuem tabela nutricional e não são produzidos com gordura hidrogenada. Também estão em testes sem leite e açúcar, com leite de amêndoas, sem lactose. Já na Solaretto Sorvetes, há uma linha de sorbets produzida à base de água e fruta, além dos sorvetes “salgados”, como o de tomate com manjericão, que costuma ser servido como uma entrada ou junto de aperitivos em happy hours que a casa costuma receber. “O setor entendeu que o consumidor precisa ser estimulado nos períodos em que as vendas são menores e tem se esmerado lançando novos produtos, como sabores premium, inovando nas texturas ou sorvetes com baixos teores de açúcar e gordura. Inovação e criatividade em alta contam muito nessa hora”, afirma Weisberg, da Abis.

Olho na gestão

Além da sazonalidade, as sorveterias, como qualquer outro negócio, enfrentam questões como fluxo de caixa, planejamento de marketing e mão de obra. Para o consultor de negócios do Sebrae-SP, Luiz Felipe Navarro, é importante que as empresas se atentem a esses pontos, treinem seus colaboradores e cuidem bem das finanças, precificando corretamente os produtos. “É preciso saber exatamente quanto que esse sorvete custa para o negócio. Será que dá para precificar todos da mesma maneira? Estar atento a todas as variáveis de gestão é um cuidado fundamental”, alerta.

Pensando nisso, Navarro elenca dez orientações para quem já atua no setor de sorvetes ou para quem quer começar a empreender para vender o ano inteiro e não sofrer com a sazonalidade.

1) Planeje – Hoje não é possível fazer um planejamento somente anual, mas sim semestral, trimestral, bimestral e mensal para que o gestor tome atitudes corretivas ao longo do tempo de forma mais rápida.

2) Ouça o cliente – O cliente é a chave principal dentro do negócio, parte determinante da tomada de decisão. É ele quem constrói todos os caminhos da empresa: escolhas, sabores dos sorvetes, composição da experimentação etc.

3) Inove – A inovação estimula as pessoas a buscarem pela sua empresa. Vale analisar sempre a diversidade dos produtos oferecidos, seja o sabor, tamanho ou formato.

4) Redes sociais – É importante pensar em ações que prendam a atenção dos clientes nas mídias sociais e nos diversos canais de marketing para que o cliente sempre tenha a marca na lembrança.

5) Faça parcerias – Quem gosta de consumir sorvete costuma fazer o quê? Se você escuta o seu cliente e sabe que ele costuma frequentar certos bares ou restaurantes, procure fazer parcerias com estes estabelecimentos para garantir a jornada completa do cliente.

6) Atente-se às finanças – Tenha sempre as finanças saudáveis e de forma muito clara, sabendo o que pode fazer, quando, como e trabalhe bem para que não incorra em erros que prejudiquem o negócio.

7) Treine sua equipe – O time precisa estar motivado, comprar a ideia e ser o consumidor interno dentro da empresa. Todas as vezes que um caixa vai receber o pagamento do cliente, precisa interagir com o consumidor, ouvir se a experiência foi positiva, negativa, saber o que aconteceu e estar atento.

8) Olho no mercado – Atenção aos concorrentes e novidades do mercado, sempre de olho no que pode afetar a empresa.

9) Atenção ao online – Se a empresa não atua de forma online nos dias de hoje, há a tendência de não ter resultados concretos como um todo. Não adianta ter apenas o ponto físico. Vale ter a opção de levar o sorvete até a casa ou empresa do consumidor. O conceito de conveniência é muito importante nos dias atuais.

10) Evolua – Procure sempre planejar alguma mudança positiva para a marca. As mudanças mostram e apresentam coisas novas e diferentes que é o que o consumir busca: melhorias no ponto de venda, evolução da marca, premiações, bonificações para o consumidor, tudo que coloque a marca em evidência.

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