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Ponto de venda se transforma em ponto de experiência

Varejo busca formas de tornar o ato da compra uma atividade cada vez mais atrativa para aproximar marcas de clientes
Por Redação
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Tendência cada vez mais forte e explorada pelas empresas, o ponto de venda (PDV) atualmente se caracteriza por ser um local para o cliente viver experiências com marcas e produtos. Expor mercadorias para que o consumidor apenas escolha e pague sem que a loja ofereça nada além já não basta para quem realmente quer se diferenciar, criar uma impressão marcante no público e fidelizá-lo.

A missão internacional do Sebrae-SP que viajou a Nova York para a conferir a NRF Retail’s Big Show, a maior feira de varejo do mundo, também percorreu a cidade para explorar esse modelo de PDV. O grupo de 30 empresários de diferentes ramos visitou 16 lojas e pôde conhecer exemplos variados de estratégias.

O caso mais impactante é o da loja oficial, e única no mundo, do personagem Harry Potter. Inaugurada em 2021 na Av. Broadway, o local é um mergulho no universo do personagem. O espaço é cheio de detalhes que reproduzem os cenários e elementos do filme – uma réplica da Fawkes, a fênix de Dumbledore decora o centro do estabelecimento – e oferece várias oportunidades de interação entre a loja e os clientes. É possível participar de simulação do voo na vassoura em realidade virtual, testar a varinha mágica, ouvir áudios do filme e o tempo todo o consumidor é levado a fazer uma imersão na história criada pela britânica J. K. Rowling.

A loja, obviamente, tem todo o tipo de produtos ligados às aventuras do bruxo: roupas, canecas, mochilas, brinquedos, cerveja amanteigada, doces, até a carta de aceitação de Harry Potter, entre muitos outros itens.

“É um grande show room em que se observa todos os bons conceitos que podem ser aplicados em qualquer tipo de varejo”, diz o gerente de relacionamento do Sebrae-SP, Alexandre Robazza. “Estamos falando de experiência elevada a sua máxima potência: a loja oferece gamificação, parceria com outras marcas, visual merchandising, tematização conforme os conceitos do próprio filme.”

“É uma das experiências mais completas de storytelling, que faz com que todo esse entretenimento acabe levando às compras. Além disso, a loja só contrata funcionários que gostem do filme, tanto que são chamados de associados porque conhecem a história e sabem detalhes para atender bem”, explica o consultor de negócios e especialista em varejo do Sebrae-SP, Edgar Neto.

Outra loja visitada foi a da Lego, no famoso Rockfeller Center. Basta entrar para ser impactado por um Hulk do tamanho de uma pessoa sentado em um banco, um táxi amarelo do tamanho de um carro de verdade e a Árvore da Descoberta, todos montados com peças de Lego e ótimos para fotos.

“Loja se autointitula um parque e sempre que uma família entra no estabelecimento, alguém da equipe primeiro conversa com a criança e depois com os pais”, explica Robazza. Em seus dois andares, o local oferece possibilidades de a criança interagir com os produtos e com tecnologia, como construir objetos com as peças de encaixar ou um autorretrato. Soma-se a isso todo o portifólio de kits temáticos para serem adquiridos.

A tour por lojas em Nova York incluiu a The RealReal, no Soho, especializada em produtos de moda de luxo de segunda mão, como roupas masculinas e femininas, relógios, joias e decoração. O grande diferencial é a oferta de itens raros, de coleções antigas, às vezes únicos. Os produtos de grife e caros (há alguns raros que custam milhares de dólares) são vendidos em consignação, isto é, a pessoa que quer se desfazer da mercadoria só recebe depois que a loja vende, ficando com uma porcentagem do valor. O estabelecimento tem um processo de autenticação com especialistas que avaliam cada item, evitando falsificações, protegendo assim quem compra e quem vende. Com esse modelo de negócio, a empresa manifesta sua preocupação com a sustentabilidade, respeitando o ciclo de vida do produto e evitando o desperdício. Essa prática aparece também nas sacolas recicladas usadas ali. Mensalmente, a empresa publica em seu site listas com os itens que recebe, possibilitando as compras online.

Já a Nordstrom é uma loja de departamentos em Manhattan que vende artigos de grife, com uma grande variedade de moda masculina, feminina, infantil, calçados e produtos para o lar. O estabelecimento tem cinco pisos, quatro restaurantes e dois bares, tudo para fazer com que o cliente se sinta confortável no local e acabe tendo uma experiência de compra mais agradável. Uma das estratégias da empresa é permitir que a cliente, leve para casa vários vestidos, por exemplo, escolha aquele que quer comprar e devolva os demais.

Assim como a Nordstrom, outras marcas investem na transformação de seu espaço físico um lugar de convivência em um atendimento que se transforme em relacionamento.

O grupo de empresários reunidos pelo Sebrae-SP visitou a Hermès, loja de alto luxo voltada para clientes de elevado poder aquisitivo, onde cada detalhe é cuidadosamente pensado para oferecer um ambiente de extrema sofisticação. O tapete, a escada, os quadros na parede, passando pelo principal – roupas masculinas e femininas, joias e artigos para o lar – formam um conjunto de extremo bom gosto com o qual a grife busca proporcionar momentos agradáveis ao cliente, seja escolhendo o que vai levar, seja relaxando nas poltronas ou no jardim externo no topo da loja enquanto toma champanhe. A empresa, que começou fabricando selas para cavalos, oferece uma experiência diferenciada – e para poucos – nas suas lojas.

Quem segue a mesma linha de atuação oferecendo mordomias a clientes com muito dinheiro é a Ralph Lauren. A marca tem duas lojas na Av. Madson, em Manhattan, uma em frente à outra, separando assim moda masculina e feminina. Os imóveis em si já são memoráveis por comporem uma atmosfera glamourosa. Lustres avaliados em cerca de US$ 44 mil são um atrativo à parte – e à venda – mas tudo ali é posicionado para agradar os gostos mais refinados. Há salas montadas com móveis e artigos de decoração para a casa (todos com a marca Ralph Lauren e à venda) com sofás e banheiros para que o consumidor não tenha pressa de ir embora, já que pode tomar café, champanhe, o que quiser, enquanto decide o que levar. É com esse tratamento que a loja busca cativar ainda mais seu público.

Deixando de lado o perfil das grifes de alto luxo, o grupo do Sebrae-SP foi até a Shopify, marca que administra uma plataforma de e-commerce. A empresa criou um showroom no Soho, cujo foco é trabalhar a comunidade em que ela está inserida. O espaço do Soho serve para lojas pop ups, ou seja, lojas que ocupam um determinado espaço físico temporariamente. O local conta ainda com uma área de eventos, um café e um estúdio para fotografar produtos que serão anunciados no e-commerce. O empreendedor, usando as ferramentas da Shopify pode construir sua própria loja virtual.

A Neighborhood Goods foi outra loja visitada.Trata-se de uma loja de departamentos muito bem resolvida em sua proposta. Grifes diversas se dividem e se revezam em um espaço com moda masculina e feminina, calçados, cosméticos. O local também oferece um bar, aos sábados um DJ se apresenta na loja e há uma grande preocupação com o atendimento, tanto que os funcionários passam por treinamentos e reuniões frequentes a fim de estarem bem preparados para receber os clientes. Mais uma vez, a ideia é proporcionar uma ótima experiência ao consumidor tendo processos estruturados com essa finalidade na empresa, de acordo com Edgar Neto, do Sebrae-SP.

Mas nem sempre oferecer uma experiência relevante tem ligação com a sofisticação, alto poder aquisitivo ou algum atrativo como um personagem de cinema de sucesso.

O Rio Supermarket é um negócio de brasileiros instalado no Queens, ou seja, fora da aura de luxo que permeia toda Manhattan. O estabelecimento é o típico mercado de bairro encontrado em qualquer cidade do Brasil e seu grande trunfo é conquistar a memória afetiva dos brasileiros que vivem em Nova York. O local só vende produtos made in Brazil, como pão de queijo, coxinha e inúmeras marcas nacionais, indo de arroz, feijão, óleo de cozinha, passando por requeijão, chinelos e até camisas de times de futebol. A carne, apesar de vir da Austrália, tem os cortes brasileiros.

O público do Rio Supermarket é formado por 70% de brasileiros e 30% de americanos e outras nacionalidades. O negócio tem ainda três outras operações: as vendas também são feitas pela internet com entrega em outras cidades dos Estados Unidos; no mesmo endereço funciona um restaurante por quilo tipicamente brasileiro, e ali também é possível fazer remessas de dinheiro para o Brasil. O negócio, mesmo na simplicidade de seu ponto físico, acaba oferecendo mais do que mercadorias ao aproximar os brasileiros nos Estados Unidos do Brasil.

Em ramo bem diferente, a Reddy by Petco é uma loja especializada em produtos para cães que traz a sustentabilidade em sua proposta. O piso da loja é feito com madeira recuperada de demolição. No espaço há três mesas de aço e madeira recuperados. O lustre é feito com bolas de tênis, que normalmente os donos usam para brincar com seus cachorros. Noventa e nove por cento dos produtos vendidos na loja são feitos com materiais recicláveis.

Aproveitando o forte laço que normalmente existe entre cão e dono, a loja também vende itens que fazem par, assim eles podem usar roupa e cachecol, respectivamente, com a mesma estampa, por exemplo, possibilitando que saiam para passear com peças combinando. A loja tem ainda coleções de roupas para cães que acompanham a intensidade do frio, permitindo que o animal use a mais adequada para cada tempo. O provador de roupas dos bichos é instagramável e a fotos ficam expostas na parede, ação que traz engajamento do consumidor.

É normal ocorrerem na loja festas de aniversário de graça para os cães de clientes assíduos. O dono pode ainda sentar, relaxar e deixar seu celular carregando em uma estação específica para isso enquanto um funcionário da loja providencia uma estampa personalizada para as roupas do cachorro. Outro atrativo são os alimentos de nível premium vendidos, que podem ser consumidos até por humanos.

Após um período em que o comércio digital ganhou muito espaço, tudo indica que a loja física voltou a protagonizar o varejo, porém, trabalhando por obter um nível de relacionamento muito mais próximo com o cliente.

  • NRF; Sebrae-SP; varejo; Nova York